quinta-feira, 6 de fevereiro de 2014

Previsões de chuva para o inverno no Semiárido renovam expectativas de famílias agricultoras


Ylka Oliveira - Asacom
05/02/2014
 
 No agreste do estado de Pernambuco, nuvens mostram a chuva chegando em fevereiro. | Foto: Ana Lira/Arquivo Asacom
Começa o mês de fevereiro e as famílias agricultoras que vivem no Semiárido brasileiro alimentam a expectativa de todos os anos: que as chuvas possam chegar ainda no primeiro trimestre para garantir o estoque de água para beber, cozinhar, para o plantio, a colheita e a dessedentação animal.  As previsões de institutos de meteorologia e dos profetas das chuvas do Semiárido, que se reúnem anualmente no município de Quixadá, no Sertão cearense, para analisar os sinais da natureza e dos animais são de que será um inverno tardio com a chuva chegando somente em março.

Os profetas que detêm o conhecimento popular observam a natureza e os fenômenos que se repetem, já acertaram com a previsão de que a chuva não cairia no Sertão no mês de janeiro. Um dos profetas da chuva do município de Quixadá, Ribamar Lima, de 66 anos, faz essa previsão desde 1958. Aprendeu a interpretar os sinais da natureza com a família, quando tinha 10 anos. Ribamar afirma que os animais sabem muito mais que homens e mulheres quando se trata de interpretar os sinais do tempo.

“Se você vir um ninho de rolinhas [pássaros] no leito de um rio pode ter certeza que não irá chover. As rolinhas levam 28 dias para eclodir. A rolinha não iria arriscar em deixar o ninho ali. Já a caranguejeira quando começa a andar é porque vai chover. As formigas também, se elas começam a se movimentar é sinal de chuva”, revela. Segundo o profeta a primeira lua cheia desse ano saiu limpa, não tinha preparação para chuva. “A partir de abril vai haver recarga dos açudes, mas não deve ser um inverno tão criadouro”, afirma. (Para saber mais sobre os Profetas da Chuva clique aqui).

Para o ano de estiagem vivido em 2013, as possibilidades de chuva e de um inverno melhor já animam o povo do Semiárido. As previsões meteorológicas de órgãos de pesquisa, como o Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (INPE) é de que para o primeiro trimestre há 40%de probabilidade de chover na média, 25% acima da média e 35% abaixo. Para os últimos anos de estiagem essa se mostra uma das melhores previsões de chuva.

Na avaliação do coordenador do Programa Uma Terra e Duas Águas (P1+2) da Articulação Semiárido Brasileiro (ASA), Antonio Barbosa, chover 40% na média é uma das melhores previsões para o Semiárido, quando comparamos aos últimos anos de seca. “Olhando para as duas histórias [profetas da chuva e institutos de pesquisa do Brasil] a perspectiva é de que chove, mas isso deve atrasar um pouco. Precisamos de chuva de janeiro a maio. Se tivermos o primeiro trimestre sem chuva vamos ter um prejuízo grande. Outra coisa importante de observar é levar em consideração duas variáveis: espacialidade e temporalidade”, explica.

Em se tratando de espacialidade, a chuva poderá vir de forma diferenciada no Semiárido. Por exemplo, nessa primeira semana de fevereiro já choveu nos municípios de Bezerros e Caruaru, Agreste do estado de Pernambuco. Enquanto na região de Juazeiro, município baiano, houve chuvas no final de novembro e início de dezembro do ano passado. Em janeiro ainda não houve precipitações. Enquanto a questão temporal reforça o fato de que pode chover num determinado lugar muito mais, e passar um tempo sem chover em outras regiões.

No Semiárido baiano, a agricultora Clemilda Soares, de 39 anos, da comunidade de Pau Preto, no município de Juazeiro, comemora a chuva que caiu no final do mês de novembro e em dezembro do ano passado. Embora tenha chovido não significa que o inverno tenha chegado no final de 2013. Segundo Dona Clemilda fazia três anos que não via chuva na região. A cisterna-enxurrada de 52 mil litros, que armazena água para produção de alimentos e criação animal foi reabastecida. Assim como a cisterna de 16 mil litros, que também está com água estocada para beber e cozinhar. Mesmo que o inverno não chegue nesses primeiros meses do ano, a agricultora garante que poderá aguar a horta onde cultiva coentro e alface e dar água para as cabras, galinhas e porcos que cria. 

“Aqui em Pau Preto vivem 60 famílias, quase todas têm cisternas. Se não existisse essas cisternas não morava mais ninguém aqui. Eu já sou agraciada, mas tomara que essa chuva chegue. Porque com a chuva chegando eu quero plantar cenoura, quiabo e maxixe”, conta Dona Clemilda.

Para Barbosa, pode-se avaliar que o Semiárido está saindo de um ciclo de seca aguda, mas essa saída ainda não está totalmente caracterizada. É possível que em alguns locais haja mais chuva, com mais produção de alimentos para as famílias agricultoras. Enquanto em outras regiões as famílias ainda podem sofrer com a estiagem.  “Esse tipo de chuva na perspectiva de encher os reservatórios será importante. Quem tem barreiro, cisterna-calçadão e um conjunto de outras tecnologias a tendência é ter recarga. Se tiver um período de veranico, a produção, sobretudo a cultura de sequeiro [milho e feijão, muito comum na região] estará comprometida. Isso para algumas regiões”, disse o coordenador do P1+2.
 
 Barreiro-Trincheira começa a receber água da chuva, no Agreste de Pernambuco. | Foto: Ana Lira/Arquivo Asacom
Entre os ciclos de chuva na região semiárida, o estado de Pernambuco compreende o espaço onde as chuvas começam a cair no final de dezembro, início de janeiro e fevereiro, podendo seguir até maio.  A agricultora Joelma Pereira, do Sítio Pedra Branca, no município de Cumaru, Agreste pernambucano, conta que choveu dias 03 e 04 deste mês, mas foi uma chuva ainda considerada pouca para encher os reservatórios. Porém, já é água para dar um alívio à terra, às plantas e diminuir o calor. "Tem chovido pouco aqui em Cumaru. Mas a pouca chuva que caiu conseguimos guardar e deu para alimentar as galinhas, por exemplo. As pessoas mais velhas estão bem confiantes, eles dizem que este será um ano bom de chuva, tanto é que no ano passado comentaram a importância da gente guardar as sementes para plantar este ano, porque vai chover”, fala Joelma.
A agricultora guardou três espécies diferentes de sementes de milho, três tipos de fava e quatro tipos de sementes de feijão. A expectativa de Joelma agora é que as chuvas sejam contínuas para iniciar o plantio diversificado, para encher as cisternas e cuidar dos animais e das plantas.
Em 2014, no campo estruturante a ASA deve intensificar a sua ação para quando a chuva chegar poder armazenar a água. “Esperamos que nesse ano de 2014 tenhamos boas chuvas em todas as regiões do Semiárido brasileiro. Estamos ampliando as nossas parcerias e é importante destacar que são parcerias com a Petrobras, MDS (Ministério do Desenvolvimento Social e Combate à Fome) e BNDES (Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social). Então a ASA com a ampliação do Programa Uma Terra e Duas Águas e com a continuidade do Programa Um Milhão de Cisternas vem garantido um conjunto de tecnologias, que vai permitir que o agricultor/a possa captar água da chuva e tendo isso é viver com tranquilidade e com dignidade no Semiárido brasileiro”, conclui a coordenadora executiva da ASA pelo estado de Pernambuco, Neilda Pereira.

XVIII Encontro Estadual dos Profetas das Chuvas - Foi realizado no mês de janeiro, no Parque de Exposições da Associação de Criadores de Caprinos e Ovinos do Ceará (Acocece), em Quixadá. Participaram homens e mulheres observadores/as dos sinais da natureza. A maioria prevê um ano bom para plantar, enquanto outros apostam na escassez.

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